Depois de conhecer quer o mundo político quer o mundo académico, acho que posso dizer que este não tem como dar lições de moral ao primeiro. Em ambos os mundos, a rivalidade mimética, descrita por René Girard, faz estragos. Desde que emerge, o lider é objecto de sentimentos ambivalentes: elogiamo-lo e apoiamo-lo, enquanto que, ao mesmo tempo, preocupamo-nos com o poder que ele pode acumular. Os militantes e discípulos, que o reconhecem, admiram-no, mas os que estão mais perto dele querem imitá-lo e ao mesmo tempo ocupar o seu lugar. Assim, como não há dirigente político sem um acólito arrivista que, depois de viver à sombra do seu chefe, não esteja disposto ao que quer que seja para ocupar o seu lugar, também já não há director universitário sem um ambicioso subalterno, que acabe por achar que pode ser um bom líder. É que cada ser humano identifica-se sempre com alguém que admira - é desta forma que progride - até que, um belo dia, dá-se conta de que é seu igual e entra numa luta feroz para ocupar o seu lugar. E, quando há dois candidatos para um só posto, temos a batalha no horizonte: os protagonistas preparam as armas, e cada um escolhe o seu lado. A menor faísca incendeia a pólvora.
A universidade reproduz este cenário de uma maneira tão regular e caricatural que, para um observador externo, assemelha-se a uma bela comédia. Desde o interior, por outro lado, as situações são patéticas, de tão ridículo que se revela a disfarce intelectual (ver epistemológico) destes conflitos, à luz das disputas entre pessoas, que acabam a odiar-se de tanto que se parecem, preferindo, cada um, consagrar a sua energia a liquidar os seus iguais, em vez de se defenderem de inimigos comuns.
Sem dúvida que, tal como os meus colegas, participei neste jogo mortal, representando, talvez algumas vezes, o meu papel neste espectáculo. Não é fácil escapar à mecânica da identificação mimética, tanto mais quanto os espectadores se deliciem de antemão com ela. É muito difícil escapar desta armadilha. Manter uma relação de admiração, sem competição, com um colega é um milagre. Mas eu tive essa sorte: desde o meu primeiro trabalho em ciências da educação que leio Daniel Hameline, e até hoje tenho beneficiado do diálogo que mantenho com ele. Durante muito tempo ensinou filosofia da educação na universidade de Genebra e publicou numerosas obras. Pouco tempo depois da defesa da minha primeira tese, de cujo júri fez parte, convidou-me a escrever um livro, que prefaciou, dirigido a professores. Desde então não tem deixado de apoiar-me. Nunca houve qualquer rivalidade entre nós, pelo contrário: é com prazer que reconheço nele o meu professor. Estou consciente de que não poderei adquirir a sua cultura filosófica e pedagógica, nem tão pouco aceder à sua mestria nas obras de Bach. Tão pouco qualquer intenção de imitação: temos feito escolhas, em grande medida opostas, no que respeita à relação com as instituições; ele manteve uma estudiosa discrição quando eu optei por uma desordenada intervenção mediática. Enfim, competição nula; sei que, escreva o que escrever ou diga, ele irá sempre um passo à frente; e será capaz assinalar-me os pontos mais frágeis e mostrar-me o que procurar para chegar mais longe.
Reconheço que há algo de antiquado nesta relação, mas aceito sem dificuldade: saber-se imperfeito e querer relacionar-se com alguém que nos ajuda a avançar não é, de forma alguma, um acto de subjugação; bem pelo contrário, é um acto profundamente libertador. Reconhecer no outro uma autoridade intelectual que nos supera impede que nos cristalizemos numa atitude de auto-satisfação. Dedicar-lhe uma discreta amizade permite abrigar a esperança de que as relações humanas podem prescindir de calculismos medíocres, ciúmes idiotas e vinganças mesquinhas. E isto não é pouca coisa. Provavelmente, é até fundamental a quem aspire ser pedagogo, quer dizer, um modesto "acompanhante" de crianças e jovens.