As missões que, por vezes,
se pretende atribuir à escola, para além das que tradicionalmente o seu
estatuto lhes reserva, são múltiplas e variadas. Algumas, dir-se-á, estão a
léguas das suas funções. Não lhe cabe, diz-se também, resolver problemas que
compete às instituições de apoio à família resolver. É verdade, não compete.
Não é sua obrigação. A menos que, por força do trabalho que desenvolve, se
sinta obrigada a resolver. A história que trago aqui hoje é um destes casos.
O Duarte era um jovem de
15 anos, fisicamente desenvolvido, pacato e com pouca iniciativa. Procurava o
contacto dos adultos (funcionários ou professores), pois os colegas
“dispensavam-no” dos seus grupos, e dos seus jogos e brincadeiras, dizendo que
ele cheirava mal.
De facto, o Duarte apresentava
roupas descuidadas, o que, combinado com a enurese nocturna de que sofria,
resultava um cheiro pouco convidativo a aproximações. Dado o desinteresse e
completo alheamento da mãe, procuramos resolver a situação da enurese junto do
médico de família. Deste preocupante desinteresse, decorre a decisão do Duarte,
de levar para a escola toda a medicação que controlava a epilepsia de que
sofria, porque tinha receio que a irmã de 2 anos a pudesse ingerir.
Para resolver o problema
da higiene foi-lhe permitido que tomasse banho todos os dias nos balneários do
ginásio. Simultaneamente, foi organizada, junto aos balneários, uma zona de “perdidos
e achados”, com 3 caixotes: um para calçado, outro para roupas interiores, e outro
ainda para vestuário diverso. Os jovens que assim o entendessem podiam recorrer
a estes caixotes, que toda a escola se preocupava em reforçar com doações.
Reunidas que estavam as
condições, o Duarte começou a aparecer mais arranjado. Gostava que lhe
dissessem isso e, um dia, por altura do Natal, uma “alma inspirada” deu-lhe um
perfume que ele nunca mais largou. Deve ter sabido doseá-lo muito bem.
O perfume é sedução, é auto-estima,
é afirmação. O Duarte, se não o sabia já, ficou a conhecer empiricamente esse
efeito.
A verdade é que este conjunto
de modificações trouxeram mais segurança à vida deste jovem. Se, com isto, não
passou a ser o primeiro a ser chamado para os grupos, pelo menos deixou de ser
repelido. O que para ele foi de grande significado.
A escola era o lugar
securizante onde ele permanecia muito para além do tempo que lhe era exigido.
Foram tempos bons. Com
mais calma. Com mais tempo para reflectir e menos daquela carga burocrática que
apenas serve para alimentar estatísticas.
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