quarta-feira, 27 de maio de 2020

Afectividade e aprendizagem no romance "Cinco Reis de Gente" de Aquilino


Lembrar Aquilino Ribeiro 13.09.1885 - 27.05.1966

Para quem passou a vida na Escola, ultrapassando as aulas e as estruturas arcaicas, obsoletas e ineficazes, terá forçosamente de se sentir tocado com esta referência autobiográfica à entrada no mundo das letras, nada fácil, deste escritor português, proposto por um grupo de amigos, como candidato ao prémio Nobel.

terça-feira, 26 de maio de 2020

Gramaticalizar: o calvário de transitar no intransitável e outras memórias de uma escola de outros tempos

Lembrar Ruben A. [26.05.1990 - 26.09.1975]
Excerto de "O mundo à Minha Procura I", Assírio & Alvim, Lisboa, 1992: pp. 75-76

Eu claudicava em matérias fundamentais: matemática  e latim. Em português conseguia às vez encontrar um mestre que me deixava ir comigo, que parava na aula e lia o meu exercício, como quem lê uma bíblia traduzida para chinês. Os outros colegas nada percebiam, uma vez que eu me afastava completamente do assunto dado para a dissertação. Não sei se foi Adolfo Casais Monteiro que um dia, na aula de português, me pediu para explicar um trecho dos Lusíadas  depois de ter lido o meu exercício sobre o assassínio de Inês de Castro. O Adolfo foi professor escasso tempo, mas para o caso pouco importa. Quando eu avancei com o livro na mão para junto da mesa, ele pediu-me que fizesse a minha crítica do célebre episódio. Ao que eu simplesmente respondi: - Senhor professor, o assassínio foi a única página que me apaixonou nos Lusíadas. Faltam mais tragédias íntimas nos Lusíadas. Gosto muito de descrições e de tudo o resto, mas sinto-me mais entusiasmado ao ler

Se de humano é matar uma donzela
Fraca e sem força, só por ter sujeito
O coração a que soube vencê-la.

O Casais Monteiro olhou para mim como querendo convidar-me para tomar café à saída do Liceu, e, na sua cara expressiva, disse que me podia sentar pois estava satisfeito. Posso dizer que devo à famosa passagem dos Lusíadas o ter-me encaminhado pela primeira vez - por uma descoberta a que não era alheio o meu estado de espírito - no sentido trágico da vida, no sentido dos gregos, de Shakespeare e de pouco mais. (...) E realmente pensando melhor, passados tantos anos, vejo que a falta de tragédia é que torna tão insípidas a nossa história e a nossa literatura. De humano, em grande parte, tivemos Inês de Castro, um pouco de Frei Luís de Sousa, e páginas da História Trágico-Marítima. De interesse universal, de valor transposto ao teatro, ao bailado, a novas interpretações, só na verdade a maravilhosa coroação daquela que depois de morta foi rainha.

Passados pouco meses, a liberdade mental de Adolfo Casais Monteiro meteu-o na cadeia. Apareceu, então, como professor de português o animal que regia latim e que a meu respeito tinha a mais fraca das opiniões. Começou para mim o Calvário de dividir orações, encontrar os complementos directos, transitar no intransitável, gramaticalizar de novo os Lusíadas de Camões. Murchei.

quarta-feira, 20 de maio de 2020

A tecnologia... A bênção dos homens!

António Nunes
«A humanização da tecnologia ao serviço da aprendizagem»! A sério?
Estes "modernistas de circunstância", sempre atentos às oportunidades de um qualquer COVID, têm esta tendência de se enredar nestes delírios, ligando a humanidade a tudo, até mesmo à tecnologia, a um robot, talvez, assim ao jeito de quem diz: olha só…, como é tão humano!

segunda-feira, 18 de maio de 2020

O vírus, um poema de Ana Luísa Amaral e as tragédias que se eclipsaram

Enquanto isso, o "sujeito" pode ser "simples e composto"

Daniel Lousada [ARTIGO EM PDF >>>]

Com a chegada do "vírus" [hoje é o vírus, amanhã outra coisa será], de repente, todas as tragédias do mundo desapareceram. Desapareceram não, eclipsaram-se, tal como a Lua durante um eclipse, que sabemos estar onde está, mas escondidaas tragédias continuam a ocorrer, só que ainda mais distantes dos olhares, quase sempre indiferentes, dos que assistem à tragédia, protegidos por uma tela. As televisões não vêem razão para procurar tragédias, lá longe, nos mares da Grécia ou noutro mar qualquer!


Serão agora mares "livres" de refugiados, à procura de paz nas suas praias?

Nós por cá, com as escolas fechadas e as crianças recolhidas em casa, alimentamos os nossos medos, com doses diárias de estatísticas de infectados. Enquanto isso, na escola da rtp memória, a professora diz que "tão tanto" têm o mesmo significado, que o "sujeito" pode ser "simples e composto"...

Como eu gostaria de ouvir contar aos nossos jovens, através das histórias e dos poemas que o professor lhes lê, longe de exercícios de gramática, que eles são bem complexos, como sujeitos!

Não me interpretem mal. Não quero desvalorizar a importância dos "sujeitos compostos", nem tão pouco o estudo da gramática. E muito menos quero pôr em causa o trabalho militante dos professores, que dão a cara pela escola na tv. Mas, a sério, acham mesmo importante, entrarem-nos sala adentro, com exercícios de sintaxe? E querem que os pais mandem os filhos fazer com isso, o quê?

Sei que, em tão pouco tempo, seria difícil inventar outro modelo. E, no entanto, alimentei a secreta esperança de ver a tv, a agarrar os nossos jovens aos saberes que a escola tem de melhor, através de outras coisas, mais de acordo com..., como direi..., o seu ADN. O meio pode não ser a mensagem, como diz Alvin Toffler, mas faz parte dela, digo eu!

"Há tanta coisa bonita que não há", diz Manuel António Pina, num belíssimo poema"coisas que já houve e já não há, livros por ler, coisas por ver (...) Tantas lembranças de que não me lembro, sítios que não sei, invenções que não invento"... Nem tudo são coisas bonitas certamente, algumas são mesmo muito feias, mas sobre as quais é tão importante falar, e zangarmo-nos com o que não tem razão de ser, e exorcizar os nossos medos, e... ... ...

E a escola? A escola está onde está, e lá estará quando voltarmos. Para já, só temos de manter a ligação!
Mas o que é da escola, da escola é: não precisamos de mandar tudo o que a escola tem para casa, até porque nem tudo chega a todas as casas, e muito menos da mesma foram!