domingo, 27 de setembro de 2020

Mil e uma maneiras de ser exigente

Philippe Meireu
Versão [condensada] em português de Luís Goucha
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Este é o titulo do capitulo 8 do livro “Ce que l’école peut encore pour la démocratie”, onde Meirieu nos relata um tempo de vida na sua escola e que, pese embora o tempo que se passou entretanto, não se distingue grandemente da escola de hoje.

Quando evocamos as “novas pedagogias” ou os “métodos activos” é preciso não esquecer que estes apenas têm valor pela exigência que nos impõemPartir do interesse e da expressão a criança”, não é tudo. Sobretudo, não podemos ficar só por aqui. Não nos devemos deixar seduzir pelas suas "ideias fantásticas", e deixá-los encerrar-se nas suas obsessões, fechando os olhos aos erros que cometem, para não os contrariar. Isto não é ajudar e pode mesmo tornar-se numa falta de respeitoÉ preciso que ela progrida e consiga atingir formas cada vez mais elaboradas de pensamento
(...)
Alguns professores podem deixar-se seduzir por modelos em que tudo corre bem, porque tudo está bem, mas a norma não é essaNão se pode esquecer a dialéctica do acompanhamento específico de cada um tal como é, para que ele possa, por si, aceder aos conhecimentos que lhe são propostosIgnorar esta dialéctica é ignorar o percurso individual de cada um e cortar a possibilidade de democratizar o acesso aos conhecimentos. LER MAIS >>>

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Letras trocadas

Maria dos Reis
Hoje, nas minhas leituras matinais, apareceu-me este texto, [viral na internet em 2003, relacio­nado  com a plasticidade do cérebro no que diz respeito à captação de sentido da mensagem]:

O texto remete-me para uma preocupação que me acompanhou durante todo o meu percurso profissional: as dificuldades específicas de aprendizagem na leitura e na escrita. Estas dificuldades podem transformar a ida à escola de alguns alunos, num suplício, apesar destes poderem demonstrar capacidades extraordinárias noutras áreas de expressão [teatro, pintura, desenho, educação física, etc.].

O facto da escola estar demasiado centrada nas aprendizagens académicas, limita a implementação de estratégias motivacionais mais diversificadas que, aplicadas à população em foco, permitiria atingir os objectivos pretendidos mesmo em áreas consideradas basilares.

No início de um ano lectivo completamente atípico, tenho-me lembrado muito destes alunos. Se o confinamento foi péssimo por não permitir a interacção entre pares, alguns terão sentido um alívio por não se sujeitarem às leituras em público, nem à contagem dos seus erros por parte de quem corrige os seus trabalhos [e a maior parte das vezes não se coíbe de verbalizar a frase fatal: “és sempre o/a mesmo/a”].

Que valorizar afinal?

Se por um lado temos o dever de acompanhar todos os alunos por forma a alcançar os objectivos propostos para o seu nível de ensino, a forma como seleccionamos as estratégias para o conseguir, é, efectivamente, o que conta.

Entender estes alunos, fazê-los sentir-se úteis e especiais nas diferentes áreas de aprendizagem é já motivação para trabalhar as áreas comprometidas. Hoje importam-me pouco explicações, mais ou menos científicas, para o fenómeno. Hoje interessa-me realçar a importância do envolvimento no bem-estar psicológico do aluno e o reforço a dar às famílias.

Como o texto que apresentei demonstra, afinal compreendemos o sentido das palavras, apesar do posicionamento das letras trocado... Em primeiro lugar, o que conta é o sentido. Depois, há que trabalhar a correcção do texto, convocando a ajuda dos pares. Só aprendemos quando estamos disponíveis para o fazer e nos sentimos bem com isso. Com avanços e recuos, conseguiram-se percursos académicos felizes. Tudo é possível quando nos envolvemos positivamente na tarefa e temos vontade de nos superar.

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

António Nunes


“A leitura, a escrita, a aritmética, só são importantes se tornarem as nossas crianças mais humanas”

A escola serve para isto...mas, por vezes [sempre vezes demais], encontra a dirigi-la e a avalia-la alguns “eruditos com poder de decisão” que a olham de forma enviesada, distante de um mundo que se quer feliz.

Os burocratas que atualmente a assaltam deveriam reciclar-se, alternando os gabinetes, onde se enfiaram, com os espaços autênticos onde os seres humanos se movimentam e vivem as suas vidas..., ouvindo o que verdadeiramente estes precisam para serem felizes.

domingo, 20 de setembro de 2020

"A Lei do Quão", de Paulo Leminski, e as pandemias que nos assolam


Leio "A lei do quão",* um pequeno poema de Paulo Leminski, e dou comigo a pensar nas sombras que nos assolam; o medo por uma pandemia, a atingir os limites do irracional, ameaça confinar as nossas vidas.

Não sei se ocorrerá "em breve / uma brisa que leve / um jeito de chuva / à última branca de neve". Mas sei que a brisa desejada não terá jeito de ocorrer se não a fizermos soprarE nada disto acontece se nos deixarmos paralisar pelo medo. Aproveitemos "então o medo para mudar; seguindo a direcção desejada" — apetece-me dizer com Gonçalo M. Tavares —, até porque "permanecer imóvel é avançar na direcção desagradável".**

Para tal, é fundamental uma estrita disciplina, uma máxima atenção aos "pequenos detalhes" [não descurar os protocolos sanitários que nos permitem manter vivos, obviamente]. Mas recusemos que tudo isto nos desvie do para quê de estar vivo. Estamos vivos para viver e não para morrer de medo.

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O título do poema, fazendo um trocadilho com a expressão popular “a lei do cão”, refere-se ao período da ditadura militar no Brasil [Em especial à lei que, entre outras medidas repressivas, não considerava a  garantia de habeas corpus no caso de crimes políticos]. Tal como o poema sugere, não há sombra sem luz, por mínima que seja. A “luz mínima” da poesia pode ser o único espaço possível para o exercício da liberdade. Um poema, coisa pequena, tem o poder de difundir, desejo de liberdade, multiplicando-o. Mas não nos iludamos: a sombra máxima está sempre à espreita.
** Gonçalo M. Tavares, "O Senhor Swedenborg e as investigações geométricas". Editorial Caminho, Lisboa, 2009: p. 39.